Ao dizer que Sarney não pode ser tratado como um homem comum, Lula reverbera a mentalidade colonial que ainda resiste nas regiões mais atrasadas do país.Ao sancionar a desigualdade perante a lei com uma frase ("O Sarney tem história suficiente para que não seja tratado como se fosse uma pessoa comum"), o presidente Lula, além de ferir o princípio constitucional previsto no artigo 5º, fez o Brasil recuar quatro séculos: ressuscitou a ideia de que é legítima a existência de uma classe merecedora de privilégios, passou a mensagem de que aos políticos cabe apenas beneficiar-se do poder e reabilitou o velho sistema de compadrio segundo o qual mãos poderosas devem lavar-se umas às outras. "É inconcebível o mais alto magistrado da República negar o componente mais básico do modelo republicano, que é a igualdade entre os cidadãos", afirma a professora de filosofia Maria Sylvia de Carvalho Franco.
A divisão entre uma classe superior de cidadãos e outra inferior está no núcleo da formação da sociedade brasileira e, a despeito de todos os avanços, ainda representa um quisto obscurantista nas regiões mais atrasadas do país – como o Maranhão de Sarney, como a Brasília dos políticos. Antes mesmo de dom João VI aportar no país, trazendo em seus baús o modelo do estado absolutista, o sistema de capitanias hereditárias já previa a diferenciação entre os cidadãos "comuns", que não tinham riquezas, e os cidadãos "incomuns", aqueles que haviam recebido terras do rei – os chamados "homens bons". Ao dizer que Sarney não pode ser tratado como uma pessoa comum, Lula ecoou, portanto, uma mentalidade colonial. O tirocínio político do presidente não dá margem para que se pense que seu discurso infeliz foi desprovido de cálculo. "Lula deve muitos favores a Sarney", lembra o cientista político David Fleischer. O PMDB apoiou o governo em momentos cruciais, como no escândalo do mensalão e no episódio dos aloprados. Lula, por motivos simétricos, agora estende o braço na direção de um de seus caciques mais poderosos – ainda que para isso tenha de arrastar o Brasil para as trevas do passado.
A divisão entre uma classe superior de cidadãos e outra inferior está no núcleo da formação da sociedade brasileira e, a despeito de todos os avanços, ainda representa um quisto obscurantista nas regiões mais atrasadas do país – como o Maranhão de Sarney, como a Brasília dos políticos. Antes mesmo de dom João VI aportar no país, trazendo em seus baús o modelo do estado absolutista, o sistema de capitanias hereditárias já previa a diferenciação entre os cidadãos "comuns", que não tinham riquezas, e os cidadãos "incomuns", aqueles que haviam recebido terras do rei – os chamados "homens bons". Ao dizer que Sarney não pode ser tratado como uma pessoa comum, Lula ecoou, portanto, uma mentalidade colonial. O tirocínio político do presidente não dá margem para que se pense que seu discurso infeliz foi desprovido de cálculo. "Lula deve muitos favores a Sarney", lembra o cientista político David Fleischer. O PMDB apoiou o governo em momentos cruciais, como no escândalo do mensalão e no episódio dos aloprados. Lula, por motivos simétricos, agora estende o braço na direção de um de seus caciques mais poderosos – ainda que para isso tenha de arrastar o Brasil para as trevas do passado.
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