Gravação mostra o mensaleiro pedindo que prefeito preso desse atenção a conselheiro do Tribunal de Contas, também investigado
Hugo Marques e Gabriel Castro
Roberto Jefferson: "Aquilo é meu irmão do coração"
(Wilson Pedrosa/AE)
Com raras exceções, a atividade política no Brasil pode ser descrita
como uma interminável troca de favores e de negociatas. É o que as
frequentes operações da Polícia Federal (PF) deixam claro: longe da
troca de ideias, o que se vê é a promiscuidade que envolve políticos das
mais variadas colorações partidárias.Um exemplo recente foi a operação Lee Oswald, deflagrada há duas semanas pela PF para investigar fraudes na prefeitura de Presidente Kennedy (ES). Durante as investigações, a polícia teve uma surpresa: descobriu a ligação do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares com o esquema. Mas, até agora, era desconhecida a participação, na história, de outro personagem do mensalão: Roberto Jefferson, deputado cassado e presidente do PTB.
Jefferson surge em um diálogo, gravado em março, com o prefeito Reginaldo dos Santos Quinta (PTB), preso na operação. No diálogo, interceptado pela polícia com autorização judicial, Jefferson e o prefeito falam de José Antonio Pimentel, conselheiro do TCE e outro alvo da investigação: "O Paulinho conversou comigo, me falou do primo dele lá, o Pimentel no Tribunal de Contas, que tá contigo, que você botou a mão nos ombros dele... isso aí, irmão, ajuda, aquilo é meu irmão do coração", diz o presidente do PTB. "Paulinho", segundo a Polícia Federal, é Paulo Hartung (PMDB), ex-governador do estado e amigo de Pimentel.
Dias antes, o conselheiro do TCE havia se reunido com o prefeito Reginaldo. Em pauta, a possibilidade de liberar licitações suspensas pelo tribunal. Após o encontro, Reginaldo comemora o sucesso da empreitada em uma ligação a Constâncio Brandão, procurador-geral do município: "Ficou tudo certo. Nós teremos tudo liberado. O que eu vou ter de readequar, já disse que vou fazer, republicar e meter bronca por que ele é seu... é tudo nosso". Na mesma conversa, ele afirma: "Atendi as exigências dele, ele abriu as pernas para mim em outras coisas. Então, ficou tudo certo".
A Polícia Federal mostra que, depois do encontro, o prefeito reabriu os editais de três obras rodoviárias. "Há um conjunto indiciatório contundente que aponta para o envolvimento inequívoco destas pessoas em fraudes licitatórias, não só no bojo da operação Lee Oswald, mas também no passado", diz no relatório o delegado responsável pelo inquérito. O caso foi encaminhado à Subprocuradoria-Geral da República, já que o conselheiro tem foro privilegiado e deve responder no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Respostas - Roberto Jefferson tem uma explicação diferente para o episódio. Segundo ele, o "Paulinho" é Paulinho do Adílio, vereador do PDT em São Jesus do Itabapoana, no norte fluminense. O presidente do PTB diz que pediu uma "ajuda"a ele para o prefeito. Seria ele o "amigo do coração". Mas Jefferson não explica a referência a Pimentel. Já o vereador fluminense diz que o presidente do PTB foi acionado para obter, na rede de saúde de Presidente Kennedy, uma cirurgia bariátrica para um morador de São Jesus do Itabapoana. As cidades são separadas por 100 quilômetros.
O conselheiro José Antonio de Almeida Pimentel, por sua vez, diz que cumpriu rigorosamente a lei e não cedeu aos pedidos do prefeito: "Como relator, eu cancelei 210 milhões reais de obras do município desde julho do ano passado", diz. Pimentel afirma que não liberou qualquer edital suspenso para a prefeitura de Presidente Kennedy. E afirma que as três concorrências citadas no inquérito foram reabertas, por decisão prefeitura, com modificações, justamente atendendo às orientações do TCE. Ainda assim, diz ele, a corte nem mesmo chegou a analisar as novas licitações e ainda pode suspendê-las.
Pimentel também nega conhecer Roberto Jefferson. E diz que não é primo de Paulo Hartung, embora seja amigo do ex-governador, em cuja gestão foi chefe da Casa Civil.
Operação - A operação Lee Oswald prendeu o prefeito de Presidente Kennedy, em cuja casa os policiais apreenderam 20 000 reais em dinheiro. Ao todo, 28 pessoas foram detidas, entre agentes públicos e empresários. O grupo fraudava licitações e lucrava com a compra e venda fraudulenta de terrenos na cidade. Delúbio Soares foi contactado pelo bando para "exportar" o esquema a municípios de Goiás.
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