27 de out. de 2013

Nem igualdade nem fraternidade

Após a prisão de uma adolescente de origem cigana durante um passeio escolar, o presidente da França enfrenta protestos em todo o país e vê seu nível de popularidade despencar

Fabíola Perez
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O fantástico lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, que consagrou a Revolução Francesa do século XVIII e que há mais de 200 anos inspira gerações, vem sendo subvertido na própria França. O aumento da xenofobia chegou ao seu ápice com a deportação, há uma semana, da adolescente de origem cigana Leonarda Dibrani, 15 anos, detida quando trafegava em um ônibus escolar e deportada para o Kosovo sem direito a apelação. Há cinco anos Leonarda vivia de forma irregular com familiares na região de Doubs, mas seus parentes já haviam entrado com um pedido de regularização. A truculência policial e a indiferença do governo de François Hollande, que não moveu uma palha para ajudar a garota, comoveram o país e levaram milhares de jovens às ruas. “Parar um ônibus e humilhar alguém em frente aos colegas de classe foi uma ação sem sentido do governo francês”, afirmou à ISTOÉ Alex Lazarowicz, cientista político do European Policy Centre. “Há muito racismo no país, principalmente contra ciganos”, concorda Olivier Dabène, cientista político do instituto francês Sciences Po. “Eles são frequentemente acusados de não se integrarem à sociedade e de comportamentos ilegais. Em tempos de crise, se tornaram bodes expiatórios.”
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Estudos recentes mostram que aversão a estrangeiros é um mal que avança de forma perigosa na Comunidade Europeia. Na Alemanha de Angela Merkel, uma pesquisa revelou que 80% da população se preocupa com a presença de imigrantes ilegais. Outro levantamento mostrou que 77% dos franceses aprovam as leis rígidas que estabelecem a deportação imediata para moradores irregulares. De olho nesses indicadores, os políticos aumentaram a intensidade de seus discursos contra os imigrantes – e é justamente essa onda de preconceito vinda de todos os lados que gera preocupação. No caso do francês François Hollande, o endurecimento contra os estrangeiros pode ser visto como uma tentativa desesperada de aumentar seus índices de popularidade. Há alguns dias, uma pesquisa de opinião trouxe um dado espantoso: apenas 23% dos franceses aprovam o governo de Hollande, o percentual mais baixo entre todos os países ricos da Europa. Mais surpreendente ainda: trata-se do menor índice desde o governo de François Mitterrand, na década de 1980.
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Hollande substituiu o ex-presidente Nicolas Sarkozy com o objetivo declarado de governar para todas as classes sociais, conduzir o país a uma solução para o desemprego e equilibrar os anseios de uma população majoritariamente de direita. Sua elevadíssima taxa de rejeição, porém, aponta para um caminho de incertezas.“Apesar de uma retórica diferente, o governo atual não marcou uma ruptura com Sarkozy”, observa Dabène, do Instituto Sciences Po. As críticas surgem principalmente pela falta de liderança política e pela incapacidade de tomar decisões. “Ele parece hesitar constantemente”, afirma o cientista político. À medida que Hollande perde popularidade, o ministro do Interior, Manuel Valls, emerge como uma voz de peso. Filiado ao Partido Socialista, mas identificado com o eleitorado de direita, o ministro declarou guerra à população de ciganos. “A cultura deles é muito diferente da nossa”, afirmou recentemente. “Como não querem se integrar, a única solução é devolvê-los para seus países.” Declarações como essas deram a Valls 89% do apoio dos eleitores de direita.
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A decisão de expulsar Leonarda foi tomada com base em informações de que a família teria ignorado diversas ordens de deixar o país. No mesmo dia em que a jovem foi impedida de participar da excursão escolar, a mãe e os cinco irmãos também foram detidos. O pai da adolescente, Resat Dibrani, havia sido deportado um dia antes da filha. Sob forte pressão e reprovação do eleitorado de esquerda, o presidente Hollande tentou voltar atrás. Disse que Leonarda poderia regressar à França para dar sequência aos estudos – mas sem a família, que deveria continuar vivendo no Kosovo. “Se ele não tem coração para acolher minha família, vou ficar”, afirmou Leonarda. “Mas um dia voltarei.”

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