Enquanto a Aeronáutica e a Marinha deverão ser contempladas com 36 aviões de combate e um submarino nuclear, o Exército brasileiro, segundo o próprio general comandante da Força, Enzo Peri, sofre com contingenciamento de recursos a ponto até de racionar a alimentação dos militares. Pelo menos em termos de investimentos (execução de obras e compra de equipamentos), dados do orçamento mostram que a distorção realmente é significativa entre as Forças; e não é de agora. Nos últimos seis anos, o Comando da Aeronáutica investiu R$ 8,1 bilhões na sua área, já descontada a inflação acumulada no período. O Exército, por sua vez, desembolsou apenas R$ 1,2 bilhão, ou seja, 7 vezes menos do que a Força Aérea Brasileira (FAB). Até a Marinha, com um contingente de 117 mil homens a menos do que o Exército, recebeu mais investimentos federais: R$ 1,9 bilhão no total (veja tabela).Em 2010, a situação não será diferente. O orçamento encaminhado pelo governo ao Congresso prevê R$ 757 milhões em investimentos para o Exército, enquanto para a Aeronáutica serão R$ 2,7 bilhões e à Marinha quase R$ 3 bilhões. Em média, desde 2004, são investidos no Exército cerca de R$ 202 milhões por ano – considerando os chamados “restos a pagar” – dívidas de anos anteriores roladas para exercícios seguintes. Na Marinha o valor médio verificado é de R$ 324 milhões e na Aeronáutica, R$ 1,4 bilhão. Em longo prazo, a diferença deverá ficar ainda maior, já que o governo se comprometeu a aplicar cerca de R$ 19 bilhões com os submarinos e pelo menos R$ 7 bilhões com os novos caças da Força Aérea.O principal programa de investimentos do Comando do Exército é o de reaparelhamento e adequação, que tem ações de modernização operacional dos batalhões de engenharia de construção e das organizações militares, implantação de brigadas especiais e de infantaria e aquisição de meios terrestres (carros de combate, tanques, etc.). No entanto, mesmo com R$ 481 milhões previstos no orçamento do programa este ano, apenas R$ 165 milhões foram desembolsados até agora, incluindo os “restos a pagar”. O montante representa 34% do autorizado para 2009. Os programas de reaparelhamento da Aeronáutica e Marinha receberam mais recursos (veja tabela).O que pesa no orçamento do Exército são as despesas com pessoal e encargos sociais, já que é a Força com o maior número de militares: 183 mil. Por isso, o Comando gasta muito mais com a rubrica do que as demais. Entre 2004 e 2009, cerca de R$ 98 bilhões foram destinados a pagamento de salários e benefícios sociais no Exército, montante superior ao pago na Aeronáutica (66,8 mil militares) e Marinha juntas no mesmo período: R$ 88 bilhões.Para o professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) Antônio Ramalho, a estratégia nacional do Exército, de presença física no território, faz com que os gastos do Comando com custeio sejam muito maiores do que nas outras Forças. Esse é um dos motivos pelos quais, segundo ele, o Exército tem menos investimentos do que as demais e um orçamento muito maior para pagar, por exemplo, material de consumo como alimentação. “Além disso, os armamentos do Exército são mais baratos. No entanto, países como Estados Unidos e França possuem projetos bastante sofisticados para o Exército”, destaca.Ramalho acredita que os generais “têm o pé no chão e sabem que o cobertor orçamentário da Defesa é curto”. “Vale destacar ainda que os investimentos para a compra dos novos caças e dos navios farão com que as ações do Exército sejam mais integradas à Aeronáutica e à Marinha. Isso porque parte dos aviões será destinada a uma nova base que deverá ser construída no centro do país e porque uma nova base da Marinha será erguida próxima à foz do rio Amazonas. É na Amazônia que o Exército tem sua principal missão”, explica.“Não pode existir relação orçamentária entre as Três Forças”A Assessoria de Comunicação Social (Ascom) do Ministério da Defesa informou em nota encaminhada ao Contas Abertas que “não existe, e nem pode existir, uma relação fixa entre os orçamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica”. De acordo com a assessoria, “cada Força tem suas realidades e projetos específicos, com cronogramas próprios e prazos de maturação diferenciados. Muitas das ações do Exército, por exemplo, exigem uma proporção maior de custeio em relação ao investimento, por envolver um número maior de pessoas, enquanto os principais equipamentos da Marinha e da Aeronáutica são intensivos em capital”, diz. Segundo a Ascom, “essa é uma das razões pelas quais o orçamento de custeio do Exército, no Projeto de Lei de 2010, teve um crescimento de R$ 104,4 milhões, na comparação com o PLOA de 2009, enquanto a Marinha sofreu uma redução de R$ 436,2 milhões em seu custeio, e a FAB perdeu R$ 75,4 milhões”. A assessoria afirma ainda que de acordo com as diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa, cada Força enviou à Defesa uma proposta de equipamento e de articulação, com o horizonte de 2009 a 2030. “As propostas estão sendo analisados com o objetivo de consolidação. Nessa análise, serão observadas, entre outras coisas, coerência com a Estratégia Nacional de Defesa, e a eventual ocorrência de superposição e de inconsistência entre as propostas”, aponta. Como exemplo, a Ascom cita o caso das brigadas do Exército, que “terão que ficar próximas às bases da Força Aérea onde ficarão localizados os aviões de transporte KC-390, que terão como principal missão estratégica deslocar essas brigadas em caso de mobilização”. Ainda na nota, a assessoria afirma que o orçamento do Exército em 2010 contemplará programas de mobilidade estratégica, Amazônia protegida, sentinela da pátria e combatente brasileiro. Clique aqui para ver a nota na íntegra.Apesar da posição oficial destacada pela Defesa, autoridades ouvidas pelo jornal O Globo há cerca de uma semana disseram que os projetos das outras Forças são elogiáveis, mas não justificam “o abandono das demandas do Exército”. Segundo o jornal, um general não identificado citou três prioridades que não foram contempladas no orçamento de 2010: a renovação da frota de blindados, já licitada e estimada em R$ 5 bilhões para a fabricação de mil veículos; a montagem de um sistema de defesa antiaérea, sem previsão de gastos; e a promessa de dobrar a presença militar nas fronteiras da Amazônia. O Contas Abertas também encaminhou e-mail para o Ministério do Planejamento para que a pasta comentassase o assunto. No entanto, até o fechamento da matéria, o órgão não se manifestou.Dados consideradosOs investimentos considerados para as Três Forças seguem o mesmo critério adotado pelo Ministério da Defesa quanto ao agrupamento das unidades orçamentárias. Os valores atualizados, inclusive, são ajustados pelo mesmo índice, o IGP-DI. Os investimentos do Exército englobam o Comando do Exército, a Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), a Fundação Osório e o Fundo do Exército, enquanto nos investimentos da Aeronáutica estão o Comando da Aeronáutica, a Caixa de Financiamento Imobiliário da Aeronáutica, o Fundo Aeronáutico e o Fundo Aeroviário (substituído no decorrer dos anos no orçamento pela Agência Nacional de Aviação Civil - Anac). Já na Marinha são consideradas as seguintes unidades: Comando da Marinha, Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, Fundo Naval, Fundo de Desenvolvimento do Ensino Profissional Marítimo e Caixa de Construção de Casas do Pessoal da Marinha do Brasil. Os investimentos citados na matéria fazem parte do Grupo de Natureza da Despesa (GND) 4 – nomenclatura oficial de investimentos no orçamento – e não incluem as inversões financeiras (GND 5), que são despesas com a aquisição de imóveis, títulos representativos de capital de empresas ou entidades já existentes, constituição ou aumento do capital de empresas. Acompanhe o Contas Abertas no Twitter.
22 de set. de 2009
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