Seis anos depois de deixar o poder, petista convive com o descrédito político, o sumiço dos amigos e os inquéritos da Lava Jato
        Por 
                 Thiago Bronzatto, de Caruaru, e Daniel Pereira
               
         
        
      
ENTREATOS - Lula com militantes sem-terra em 
Pernambuco, na semana passada: maior inclinação para reminiscências 
(Cristiano Mariz/O ocaso de Lula: desprestígio, abandono e suspeitas)
 
Às 7h50 da última quarta-feira, um segurança do ex-presidente 
Lula chegou ao Aeroporto Oscar Laranjeira, em Caruaru, no agreste de 
Pernambuco. Diligente, comunicou que um Gulfstream G200, avião executivo
 de luxo e alta performance, estava a caminho da cidade. Minutos depois,
 dois representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra 
(MST) e o vice-prefeito Jorge Gomes (PSB) estacionaram seus carros no 
local. Estavam apreensivos, porque não havia militantes para oferecer 
uma recepção calorosa a Lula. “Eles vão chegar. Pode ficar tranquilo”, 
disse um dos líderes do MST ao segurança, tentando amenizar a tensão. 
Uma hora mais tarde, só oito pessoas aguardavam o ex-presidente. “Vamos 
partir para o plano B. Acho melhor receber o Lula no hotel. Manda o 
pessoal para lá”, ordenou o guarda-costas. Em seguida, ele trancou a 
porta de entrada do saguão do aeroporto, que é público, para evitar que 
alguém fotografasse o deserto que aguardava Lula, aquele que já foi um 
dos políticos mais populares do mundo. “O cara”, como disse o presidente
 americano Barack Obama, numa ocasião em que se encontraram.
Lula desembarcou às 9h13 acompanhado do senador Humberto Costa 
(PT-PE). Driblou as poucas pessoas curiosas que o aguardavam e deixou o 
aeroporto pelos fundos. “Pensei que ele fosse ao menos pegar na minha 
mão e me cumprimentar”, reclamou Augusto Feitosa, funcionário do 
aeroporto. Os tempos são outros. A popularidade e o prestígio de Lula 
também. Caruaru é testemunha dessa transformação. Em 27 de agosto de 
2010, o então presidente desembarcou no mesmo Oscar Laranjeira ao som de
 uma orquestra formada por estudantes de uma escola pública. O saguão 
estava lotado. Sorridente, Lula abraçou eleitores e posou para fotos ao 
lado de autoridades como Fernando Haddad, então ministro da Educação, 
hoje prefeito de São Paulo, e a então primeira-dama do Estado de 
Pernambuco, Renata Campos. Em seu último ano de mandato, Lula 
beneficiava-se do crescimento econômico, que atingiu 7,5% em 2010. Nem o
 céu parecia lhe servir de limite. “Se a gente continuar mais dez anos 
do jeito que está, daqui a pouco chega a Caruaru e pensa que está em 
Paris, em Madri, de tão chique.”
Caruaru continua Caruaru. Figura entre as doze piores cidades para 
viver no Brasil. E Lula deixou de ser Lula. Lidera no quesito rejeição 
entre os nomes cotados para disputar a Presidência em 2018. Na 
quarta-feira passada, Lula discursou em Caruaru num auditório com 
capacidade para setenta pessoas. A plateia era formada por militantes do
 MST e da CUT, que preferiram tomar o café da manhã do hotel a esperar o
 petista no aeroporto. A programação previa uma coletiva de imprensa. 
Não ocorreu. Só Lula e áulicos falaram. Mas o ex-presidente mantém um 
fotógrafo e uma equipe de documentaristas, sempre a postos para captar 
as melhores cenas. Enquanto estava no hotel, um militante rompeu o cerco
 de seguranças e tirou uma foto com Lula, mas a equipe do ex-presidente o
 obrigou a apagá-la. A imagem mostrava uma garrafa de uísque ao fundo. 
Não pegaria bem nas redes sociais, foi a justificativa apresentada.
Depois do evento, Lula saiu pela garagem, num carro com os vidros 
fechados, e percorreu um trajeto de apenas 400 metros até o trio 
elétrico que o esperava para um novo discurso. “Ele parece estar meio 
distante do povo, com um olhar desconfiado”, observou a funcionária 
pública Conceissão Pessoa. Em cima do trio elétrico Pantera Fashion, 
Lula discursou para 2.000 pessoas. Cinco ônibus, com capacidade para 
cinquenta passageiros, foram fretados por 1.000 reais cada um, pagos em 
dinheiro vivo, para postar a claque diante da estrela petista. A 
programação da semana passada, por exemplo, previa uma passagem pela 
cidade do Crato, no Ceará, onde ele receberia o título de doutor 
honoris
 causa da Universidade Regional do Cariri. A segurança fora informada de
 que estava sendo organizado um protesto de alunos contra a concessão da
 honraria. A visita foi cancelada.
Em Caruaru, Lula foi ainda a um assentamento agrário do MST. Uma 
banda de pífanos, também contratada por cerca de 1.000 reais, animou a 
festa. À mesa, famílias convidadas puderam se servir de macaxeira, 
jerimum, cuscuz, carne guisada e suco de acerola. Lula bebia cachaça e 
água. Estendia o braço direito para o alto, com o punho cerrado, e 
discursava contra o “golpe” que derrubou Dilma. No fim da tarde, às 17 
horas, o ex-presidente partiu para o Recife no avião de prefixo PR-WTR, o
 mesmo que as empreiteiras Odebrecht e OAS usavam para transportá-lo ao 
exterior. À noite, na capital pernambucana, num evento em praça pública,
 Lula criticou o presidente interino Michel Temer e o juiz Sergio Moro, 
que em breve julgará um pedido de prisão contra ele. Falou à plateia e 
também à equipe que produz um documentário sobre o “golpe”. Com a chuva,
 os militantes começaram a se dispersar, e Lula teve de encerrar o 
espetáculo.