Considerado uma referência em estudos sobre o uso de combustível nuclear, Othon Pinheiro, preso na última semana acusado de receber R$ 4,5 milhões em propina, leva a força naval ao epicentro do Petrolão
Claudio Dantas Sequeira (claudiodantas@istoe.com.br)
Nova personagem
da investigação da Lava Jato, a Marinha havia sido mencionada pela
primeira vez no esquema numa negociata articulada pelo doleiro Alberto
Youssef com o ex-deputado petista André Vargas. O projeto de sociedade
entre a Labogen, a EMS e o Laboratório da Marinha, para a produção de um
“viagra genérico”, previa investimento total de R$ 150 milhões.
Renderia a ambos dinheiro suficiente para alcançar a “independência
financeira”, conforme revelou o doleiro numa mensagem de celular ao
então parlamentar. Descoberto, o plano fez água. Na época, a
força-tarefa da Lava Jato debruçava-se sobre a atuação do petista e do
doleiro sem se preocupar com os motivos que levaram a Marinha a entrar
naquele barco. Meses depois, a Polícia Federal descobriu que o irmão de
Vargas era sócio oculto de uma empresa que fechou mais de R$ 87 milhões
em contratos com órgãos públicos, como Serpro, Caixa e o Ministério da
Saúde, a IT7 Sistemas. Ante estas constatações, procuradores e delegados
passaram a se questionar quem estaria por trás da participação militar
no Petrolão. A prisão, na terça-feira 28, do almirante Othon Pinheiro da
Silva ajuda a responder essa pergunta. Mas também fazem surgir outras
questões. Por que um militar de alta patente, aposentado, com uma longa
folha de importantes serviços prestados ao País, se envolveria nessa
complexa rede de corrupção revelada pela Lava-Jato?

OUTRA VERSÃO
Fontes da Marinha dizem que os R$ 4,5 milhões em propina
para Othon Pinheiro podem ser recursos destinados a ações
secretas de inteligência naval no exterior

Na Marinha, segundo apurou ISTOÉ, fala-se
que Othon delinqüiu para conseguir a tão sonhada tecnologia de navegação
do submarino nuclear para embutir o reator brasileiro. “Para fazer uma
omelete é preciso quebrar alguns ovos”, disse à reportagem um militar
próximo ao programa nuclear. Ainda corre a versão, de acordo com fontes
da Marinha, de que os R$ 4,5 milhões pagos à Aratec, empresa em nome de
Othon cujo nome é inspirado no centro de pesquisas de Aramar, não foram
propina provenientes de contratos de obras da Usina Angra 3, no Rio de
Janeiro., como afirmou a Polícia Federal ao prendê-lo na última semana.
Os recursos teriam sido destinados ações secretas de inteligência naval
no exterior. Basicamente, dinheiro usado para pagar informantes.
Se isso for verdade, a questão extrapolaria
o âmbito do crime de corrupção para ganhar feições de um escândalo
envolvendo a segurança nacional. Claro que isso precisa ser bem
investigado, pois pode apenas tratar-se de uma estratégia de defesa do
almirante. Seria uma espécie de releitura do que ocorreu no fim da
década de 70 e início dos anos 80 com o chamado programa nuclear
paralelo, que tinha como objetivo a construção de uma bomba atômica.
Othon, que concebeu o projeto das ultracentrífugas de enriquecimento de
urânio, pertencia ao seleto grupo do programa, coordenado pelo cientista
Rex Nazareth, o “pai da bomba”, que no primeiro mandato do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a ocupar uma cadeira no
Gabinete de Segurança Institucional da Presidência. Para financiar o
programa nuclear paralelo, a Marinha desviou recursos para contas
bancárias secretas, as chamadas “contas Delta”, e realizou atividades de
espionagem no exterior – que incluíram EUA, Inglaterra, Alemanha,
França e Holanda.

Formado em engenharia nuclear pelo MIT
(Massachusetts Institute of Technology), Othon chefiou a Coordenadoria
para Projetos Especial da Marinha (Copesp) por 15 anos. Como se sabe, o
Brasil não chegou a desenvolver a “bomba”, mas conseguiu dominar o ciclo
de produção do combustível atômico para uso pacífico. No governo do
ex-presidente Itamar Franco, surgiram novos indícios de problemas na
administração de verbas públicas. Não houve acusações. Em 1994, o
almirante completou seu tempo de serviço militar e entrou para a
reserva. Voltou em 2005, pelas mãos de Lula, para presidir a
Eletronuclear. Era intocável. Othon promoveu o plano de aquisição do
Scorpéne, pois considerava como a última oportunidade para concluir seu
antigo projeto. A posição favorável ao submarino francês, porém, tinha
forte oposição dentro da própria Marinha. Um dos críticos, curiosamente,
também foi preso anos atrás por suposto envolvimento em notório caso de
corrupção. O almirante Euclides Duncan Janot de Matos caiu na Operação
Luxo da Polícia Federal, acusado de usar sua influência para fraudar
licitações na Marinha e na Petrobras, em prol do grupo Inace e empresas
coligadas. O esquema envolveria o uso de empresas laranjas sediadas nos
EUA. Janot Matos chefiou o Estado Maior da Marinha e foi cotado para
comandante, mas acabou transferido para a reserva por Lula, sendo
substituído por Julio Soares de Moura Neto, que chegou ao comando em
2007 e lá ficou até 2015. Enquanto Moura Neto e Othon preferiam a compra
dos submarinos do estaleiro francês DCNS, Janot de Matos liderava o
grupo que defendia a compra de submarinos alemães. O Brasil chegou a
contratar projetos alemães, mas a experiência foi malsucedida. Se
condenado, Othon pode ser julgado novamente pelo Superior Tribunal
Militar, correndo o risco de perder a patente e os benefícios salariais.
Segundo o STM, Othon responderá pelo procedimento administrativo
conhecido como “Representação para declaração de indignidade ou
incompatibilidade para o oficialato”.

Colaborou Josie Jeronimo
Fotos: Fernando Frazão/Agencia Brasil; JOÃO LAET/AG. O DIA /ESTADÃO CONTEÚDO
Fotos: Fernando Frazão/Agencia Brasil; JOÃO LAET/AG. O DIA /ESTADÃO CONTEÚDO
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