Pedido para o presidente da Ucrânia
investigar Joe Biden leva o Congresso a deflagrar processo de
impeachment contra o mandatário norte-americano. É a quarta vez que isso
ocorre nos EUA em 230 anos
HISTÓRICO
Presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi anuncia o processo: “As
ações do presidente violaram a Constituição” (Crédito: Mandel NGAN /
AFP))
Marcos Strecker
ALVO
Joe Biden, que está na mira do presidente dos EUA, é um possível
adversário nas eleições de 2020 (Crédito: Olivier Douliery / AFP)
O presidente Donald Trump está diante da maior ameaça à sua gestão.
Na última terça 24, em um momento histórico, a presidente da Câmara dos
EUA, Nancy Pelosi, anunciou o início de um processo de impeachment do
presidente. É a quarta vez que isso acontece em 230 anos, e a primeiro
desde o caso do ex-presidente Bill Clinton, em 1998 (e negado no ano
seguinte). As outras duas foram com Richard Nixon (que renunciou antes),
em 1974, e com Andrew Johnson, em 1868 (cuja impedimento foi negado).
Tudo começou com uma acusação feita em agosto por um membro da
comunidade de inteligência ao Inspetor Geral, Michael Atkinson, que tem a
prerrogativa de fazer investigações independentes. Trump teria firmado
um “compromisso verbal inapropriado” com um líder estrangeiro. Atkinson
classificou a denúncia como urgente, status que exige a comunicação ao
Congresso. Trump havia solicitado ao presidente ucraniano Volodymyr
Zelensky , em julho, que investigasse um caso de corrupção envolvendo a
família do ex-vice-presidente democrata Joe Biden, que é um possível
adversário de Trump nas eleições de 2020. A suspeita seria de
envolvimento no setor de gás da Ucrânia e suas ligações com um oligarca
do setor. Piorou a situação do presidente a revelação de que, antes de
falar com o presidente ucraniano, ele tinha suspendido uma ajuda militar
de quase US$ 400 milhões ao país — o que foi interpretado como uma
ameaça. A gravidade do caso levou a uma escalada na pressão contra a
Casa Branca e ao desfecho. AP Photo/Craig Ruttle
“As ações realizadas pelo presidente violaram seriamente a
Constituição. Nós não pedimos a governos estrangeiros que nos ajudem em
nossas eleições. Ele precisa ser responsabilizado, ninguém está acima da
lei”, declarou Pelosi. Ela só tomou essa iniciativa quando a gravidade
das informações sensibilizaram os últimos democratas que ainda resistiam
a abrir um processo contra Trump. A Câmara precisará aprovar a
investigação. Isso é provável, já que a casa tem maioria democrata desde
o ano passado. No Senado, de maioria governista, 20 republicanos
precisariam votar com a oposição. Isso torna, até o momento, pouco
provável que Trump perca sua cadeira na Casa Branca. Trump tem uma
grande adesão entre os republicanos. Além disso, as pesquisas indicam
que a maioria dos americanos não apoia até o momento o impedimento. Surpresa e indignação
Trump conta com isso. Ele se surpreendeu com a repercussão do caso.
Para evitar o anúncio do impeachment, apressou-se em liberar a íntegra
da gravação com o presidente ucraniano — contra a orientação de seus
assessores. Também tentou demover Pelosi. Mas não conseguiu impedir o
desfecho, que ocorreu quase ao mesmo em que discursava na ONU. Reagiu
enfurecido no Twitter: “Um dia tão importante nas Nações Unidas, tanto
trabalho e tanto sucesso, e os democratas de propósito tiveram que
arruiná-lo e diminuí-lo com mais notícias relacionadas ao lixo da caça
às bruxas. Muito ruim para nosso país!” Mas também tentou minimizar o
fato, dizendo que a investigação seria “positiva” para sua reeleição.
Biden, que tem aparecido à frente de Trump nas pesquisas eleitorais de
2020, condenou o presidente, mas foi cuidadoso. Quer evitar a exposição
negativa da ex-candidata Hillary Clinton, que foi marcada nas últimas
eleições pelas acusações de corrupção feitas por Trump.
O rumo do processo de impeachment será determinante Trump, cuja
gestão é marcada pelo dissenso, pelo ataque agressivo aos adversários,
por afirmações questionáveis e pela tentativa de desacreditar a
imprensa. Por causa disso, desde o início seu governo sofre enorme
escrutínio. Em razão de várias questões éticas, os seus adversários
começaram a discutir um possível processo de impeachment logo após sua
eleição, e ele quase foi iniciado pela suspeita de interferência russa
na campanha de 2016. Agora, o cerco se fecha. Para apurar a conduta do
presidente no último episódio, Pelosi pode formar uma comissão especial,
similar à que investigou o escândalo Watergate. Mesmo que escape ao
impeachment, Trump já conquistou seu lugar na história americana — de
uma forma bem diferente do que imaginava.
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