O país, que iniciou-se na prática de
dinheiro de corrupção com dólares na cueca, terminou com gingantescas
fortunas estocadas em casa
LAVANDERIA A SECO O tucano Paulo Preto usava apartamento para manter
R$ 100 milhões em dinheiro vivo, os quais submetia ao sol para não mofar (Crédito: Fotoarena)
Wilson Lima e Ary Filgueira
Em se tratando de dinheiro, qualquer economista, do mais brilhante ao
mais incompetente, sempre dará o mesmo conselho: dinheiro em casa,
guardado debaixo do colchão, desvaloriza. Há, porém, uma exceção à
regra. Quando o dinheiro tem origem ilícita, muitas vezes não se
consegue lavá-lo. O jeito, nesse caso, é mantê-lo mesmo em casa e ir
gastando aos poucos. Desde que descobriu-se a existência do apartamento
em que o ex-ministro Geddel Vieira Lima (MDB-BA) usava como bunker para
guardar malas e malas de dinheiro, a prática das vovós de dinheiro no
colchão foi se ampliando e ganhando ares mais sofisticados entre os
políticos. LARANJAL MINEIRO O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, guarda R$ 400 mil em dinheiro vivo em sua casa (Crédito:FELIPE RAU)
Apontado como operador de propinas do PSDB, o ex-diretor da
Desenvolvimento Rodoviário (Dersa) Paulo Vieira de Souza, vulgo Paulo
Preto, revelou-se esta semana um expert na matéria. Ele desenvolveu
inclusive técnicas de secagem periódica das notas para evitar que elas
ficassem úmidas e apodrecessem. Paulo Preto mantinha não um, mas dois
bunkers para guardar sua montanha de dinheiro sujo. Segundo informações
do MPF, Preto guardou R$ 100 milhões em dinheiro vivo durante dois anos,
em dois apartamentos: um no bairro Vila Conceição e outro na Avenida
Brigadeiro Luís Antônio, ambos em São Paulo.
Os recursos relacionados a Paulo Preto, de acordo com as
investigações da PF, eram propinas oriundas de um complexo esquema de
corrupção que envolve obras operadas em São Paulo pela construtora
Odebrecht. Para o MPF, o esquema também envolveu outros personagens como
Rodrigo Tacla Duran, Adir Assad e Álvaro Novis, doleiros que ajudavam a
lavar os recursos. Durante a operação realizada na terça-feira 19, que
prendeu Paulo Preto, foram realizadas buscas também em endereços ligados
ao ex-senador tucano Aloysio Nunes Ferreira Filho, igualmente suspeito
de receber propinas.
O “banco” de Paulo Preto deixou no chinelo o esquema de Geddel. Em
2017, a PF encontrou R$ 51 milhões no apartamento que era usado pelo
ex-ministro. A PF demorou dias para terminar de contar toda aquela
dinheirama. Os recursos foram descobertos durante a operação “Tesouro
Perdido”, um desdobramento das investigações a respeito de fraudes na
liberação de créditos da Caixa Econômica Federal, então controlada por
Geddel.
O turismo rentável AS MALAS DE GEDDEL Geddel Vieira Lima mantinha R$ 51 milhões em malas num apartamento alugado em Salvador (Crédito:AFP PHOTO / BRAZILIAN FEDERAL )
Esta semana, descobriu-se outra vovó do colchão da política. Entre
2016 e 2018, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG),
envolvido em denúncias de uso de laranjas na campanha do PSL em Minas
Gerais, juntou R$ 400 mil em dinheiro. Outra vez, a dinheirama não está
em banco ou aplicada na Bolsa de Valores, como é a tendência de quem
acumula dinheiro, mas guardada em sua casa. Ele mesmo revelou a façanha
ao ter declarado a existência da bolada em sua prestação de contas à
Justiça Eleitoral. O ministro Marcelo confessou ter um pequeno banco em
casa. Em 2018, segundo disse, precisou tirar do próprio bolso nada menos
que R$ 383 mil para injetar na sua campanha à reeleição para deputado
federal. O recurso era parte do dinheiro que possuía embaixo do colchão.
As operações financeiras de Marcelo têm o condão de lhe causar
problemas. Ele é cotado como o próximo defenestrado do governo
Bolsonaro, a exemplo do que ocorreu com o ex-ministro Gustavo Bebianno.
Embora não se tenha provas de que esse dinheiro seja oriundo de eventual
laranjal em Minas Gerais, o certo é que o próprio ministro, alegando
foro privilegiado, pediu na quinta-feira 21 que o STF fique com as
investigações sobre candidaturas laranjas em Belo Horizonte, tirando o
caso das mãos da Justiça mineira. Dinheiro demais também acaba virando
problema.
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