Acusado de estuprar uma menina de dois
anos, o oficial da PM Pedro Chavarry Duarte usava uma ONG como fachada
para atrair as mães e abusar de seus filhos. Polícia suspeita que ele
cometia os crimes há 20 anos
FOCO O coronel cresceu no
subúrbio carioca e construiu uma carreira sólida na Polícia Militar,
tendo até se candidato a deputado federal
Quando a criança começava a falar, ele não pegava mais”,
disse à ISTOÉ a mãe de um menino que já permaneceu sob os cuidados do
coronel reformado da Polícia Militar do Rio de Janeiro Pedro Chavarry
Duarte, 62 anos, preso na noite de sábado 10 sob acusação de estupro de
uma menina de 2 anos, flagrada nua e aos prantos em seu carro (leia
quadro). “Agora sabemos porque, era para que não contasse as maldades
que ele fazia.” Criado em subúrbios do Rio, como Ramos, na zona norte,
onde tem um apartamento e também se localiza o conjunto de casebres
chamado Uga-Uga, Chavarry se aproveitava do status de sua patente, do
fato de frequentar pastorais católicas e de doar roupas e fraldas na
região para conquistar a confiança das pessoas e levar suas crianças e
bebês para, segundo dizia, serem cuidados em uma ONG infantil. Sabe-se
agora que a instituição era fachada para ele poder abusar dos menores. A
Polícia trabalha com a suspeita de que o militar estuprava crianças há
duas décadas, pelo menos. CRIMINOSO
O coronel cercado de crianças da comunidade Uga-Uga: ele já havia sido
flagrado abusando de menores, mas não foi punido
ISTOÉ esteve na comunidade Uga-Uga e conversou com algumas mães que
confiavam os filhos ao coronel, e que vivem, agora, um pesadelo por não
saberem a perversidade que ele pode ter feito com seus meninos e
meninas. Para piorar, têm medo dos traficantes, que “costumam matar
moradores que mantém vínculos com gente da polícia”, como contou um
morador da região. “Já recebemos ameaças. Estão acusando a gente de
desleixo com nossos filhos e ainda corremos o risco de nos lincharem”,
afirmou uma mãe. Cinco moradoras da comunidade – entre elas a faxineira
Thuanne Pimenta dos Santos, 23 anos, que foi presa na segunda-feira 13 e
é investigada por formação de quadrilha -, trabalhavam em imóveis que
pertencem ao coronel. “Ele perguntava se tínhamos com quem deixar as
crianças para fazer a faxina e se oferecia para levá-las à tal ONG, onde
ficariam com uma babá”, disse uma delas.
Pessoas da comunidade também foram contratadas para fazer a campanha
dele a deputado federal (em 2014, pelo PSL/RJ). “Sempre tinha um PM
ajudando a gente a entregar os santinhos. Como poderíamos desconfiar?”,
afirma uma delas. As faxineiras contam que costumavam receber em torno
de R$ 150 para limpar apartamentos vazios, localizados em Ramos e Vaz
Lobo, ambos na zona norte, além de salas da Caixa Beneficente da Polícia
Militar do Rio, órgão criado para pagar auxílios a policiais militares
aposentados e familiares de PMs falecidos, presidido por Chavarry
durante seis anos. As fraldas que o coronel distribuía eram adquiridas
na empresa Mercadão das Fraldas, através de contrato com a Caixa
Beneficente. Ele também pagou, com recursos oriundos da Caixa, o enterro
de duas crianças da comunidade, no cemitério do Catumbi. O Ministério
Público está investigando os casos.
Chevarry dizia, em discursos, que se dedicava demais às causas
sociais e ao trabalho, deixando “a família em segundo plano”. É casado
com Rosana, pai de Rachel, e residia na Barra da Tijuca, bairro nobre da
zona oeste. De origem simples, nasceu e cresceu no subúrbio carioca.
Filho de Modesta Chavarry Duarte, já falecida, e Milton Campos Duarte,
ele ingressou na PM aos 19 anos para uma carreira bem-sucedida. No site
da Caixa Beneficente, é descrito como um oficial que “adquiriu
experiência necessária para se tornar um homem influente e bem visto
dentro da corporação”. E é essa ascensão que o secretário de Estado de
Assistência Social e Direitos Humanos, do Rio, deputado Paulo Melo, não
entende, pois atuou em sua prisão, em 1993, por tráfico de bebês.
Coordenador de uma comissão parlamentar na época, Melo recebeu
denúncias de uma associação de moradores de Bangu, na zona norte, e
montou uma operação, com a ajuda policial, para comprovar a acusação.
“Flagramos o momento em que ele entrou em um apartamento usado como
cativeiro pela quadrilha dele, para pegar um bebê de quatro meses, que
tinha passado a noite no chão, sozinho, nu. No lugar, havia um monte de
caixas de Lexotan que devia ser usado para dopar os bebês e uma
mamadeira com uma água estranha”, disse à ISTOÉ. Na época, Chavarry foi
preso, mas saiu impune. “É um bandido. Não entendo como foi sendo
promovido dentro da PM apesar do histórico criminal. Deveria ter trocado
a farda pelo uniforme de presidiário há muito tempo”, disse Melo. Em
1994, o nome de Chavarry apareceu na lista de policiais que recebiam
propina do bicheiro Castor de Andrade (1926-1997). Mas, após se arrastar
por 10 anos, o processo foi arquivado. E ele novamente escapou.
Agora, a PM iniciou procedimento administrativo disciplinar e,
dependendo do resultado, o coronel poderá ser excluído da tropa e perder
a patente. Além disso, vai responder na Justiça comum pelo crime de
estupro de vulnerável – a Polícia Civil investiga se existe uma rede de
pedofilia por trás de sua suposta atividade beneficente. Responsável
pela investigação, a delegada Cristiana Bento, da Delegacia da Criança e
do Adolescente Vítima (DCAV), acredita que o caso é “a ponta do iceberg
de uma monstruosidade que pode estar sendo praticada há mais de 20
anos.”
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