Lula, radical à esquerda, e Bolsonaro,
radical à direita, enfrentam o mesmo problema: estão com dificuldade em
fazer os seus candidatos a prefeito
VOLTAR? NÃO Fernando Haddad (ao lado de Gleisi Hoffmann discursando) já foi prefeito de São Paulo.
O PT o quer como candidato. Ele avisa:
“três eleições em seis anos é muita coisa” (Crédito: TIAGO CALDAS)
Antonio Carlos Prado
Como tudo e como todos no tempo e na vida, também a política tem lá
as suas boutades e os seus caprichos, e é isso o que se vê a envolver
agora, nesses dias atuais de extremismos, os dois caciques dos setores
mais polarizados da sociedade brasileira. Bolsonaro e Lula,
ironicamente, possuem nesse instante histórico um problema em comum.
Qual é esse problema? Resposta: a séria dificuldade em encontrar
candidatos viáveis para as eleições às prefeituras, que serão realizadas
no ano que vem, em todo o País. Para ambos, a questão pesa porque tais
eleições são uma enorme e importante vitrine – além de pragmática
máquina de campanha – em relação à eleição presidencial de 2022. Claro
que alianças terão de ser feitas, e nelas é vital que o ex e o atual
presidente da República sigam a seguinte e intricada estratégia: não
basta o candidato de uma eventual coligação brilhar publicamente, é
preciso que o povo saiba que ele brilha porque Lula ou Bolsonaro o
impulsionam. Em uma sintonia mais fina: é essencial que a população
absorva que determinado candidato deslancha porque Lula ou Bolsonaro o
escolheram. Como já se disse, o ato final está lá em 2022. As eleições
municipais de 2020 são apenas um rito que tem de ser cumprido no meio do
caminho. O resumo da ópera
Há cerca de um mês Lula foi solto pelo STF e uma de suas primeiras
ordens ao PT foi no sentido de que o partido lance o maior número
possível de candidaturas. A missão é, no entanto, bem mais árdua do que o
próprio ex-presidente pensava. Antigos quadros da legenda, quando
consultados, sem a menor cerimônia estão dizendo não. Além disso, há
gente nova se oferecendo, mas aí não são nomes competitivos. E,
finalmente, sobram políticos que dominam determinadas regiões e estão
muito mais atentos a seus próprios interesses do que às determinações de
Lula. Praça importante para esse jogo é, obviamente, São Paulo. Não sem
razão, portanto, é pleno de lisusas que o PT cerca a ex-petista e
ex-prefeita paulistana Marta Suplicy, hoje no MDB. Se os entedimentos
com Marta não derem certo, Lula já mandou que insistam com Fernando
Haddad, mas existe nessa hipótese um detalhe importante: Haddad já
avisou que lhe é demais disputar uma terceira eleição no espaço de seis
anos. Decodificando a sua fala criptografada: ele por enquanto não está
acreditando muito na possibilidade de o PT vencer nas urnas em São
Paulo.
Bolsonaro também olha, é claro, sobretudo para São Paulo. Quem pode
se candidatar a prefeito? Os nomes são completamente desconhecidos,
sabem deles somente o gueto bolsonarista. Uma alternativa é Edson
Salomão, amigo pessoal do presidente e fundador do movimento Direita São
Paulo. Ele quer? Ninguém sabe, Salomão ainda não se definiu. Outro nome
seria o do deputado estadual Gil Diniz, que praticamente já se mostrou
disposto a concorrer ao cargo de alcaide da maior cidade do País. Em
Belo Horizonte, outra capital que tem de ser levada em consideração
devido ao seu colégio eleitoral, Bolsonaro está com leve vantagem: é bem
provável que o deputado estadual Bruno Egler seja o candidato do
bolsonarismo, enquanto o PT segue no escuro: Patrus Ananias mantém-se
esfinge. Já o Nordeste, o importante nordeste eleitoral, o nordeste que
funciona como fator determinante de vitórias e derrotas, é região
totalmente indefinida, nela não se vê nomes nem para o bolsonarismo nem
para o lulismo.
Veio na semana passada uma boa notícica para Bolsonaro, mas que ainda
exige comemoração pela metade: o TSE decidiu que aceitará assinaturas
eletrônicas na composição de nomes para registro de novos partidos
políticos, mas tal decisão terá ainda de ser regulamentada, fato que
provavelmente não ocorrerá a tempo de Bolsonaro registrar a sua nova
legenda, chamada Aliança pelo Brasil. Sem o registro, adeus eleições
municipais. Ficou demonstrado, então, a grande ironia da qual se falou:
quis o destino que os dois líderes radicais se vissem diante da mesma
dificuldade em conseguir candidatos para 2020 — e é bem provável que
tenham de abrir mão do aspecto qualitativo e apelar ao fator
quantitativo. Resumo da ópera: sai perdendo, mais uma vez, a democracia.
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