As obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já enfrentaram toda sorte de problemas desde que o pacote de investimento em infraestrutura do governo federal foi lançado, em 2007. A maior parte deles envolvia questões ambientais, como no caso dos bagres do rio Madeira, que atrasaram de forma considerável o início das obras das duas maiores usinas hidrelétricas em construção no País, Jirau e Santo Antônio. Na época, técnicos do Ibama se recusaram a conceder a licença ambiental para o empreendimento porque não estava claro como os peixes conseguiriam atravessar as turbinas das usinas para concluir seu ciclo de reprodução. O imbróglio arrastou-se por meses e fez o então presidente Lula acusar os bagres do Madeira de emperrar o desenvolvimento do País. A crise acabou desaguando na saída da então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, do governo e, posteriormente, do próprio PT.
Passada a fase das complicações ligadas ao meio ambiente, as obras do PAC enfrentam agora um problema que parece mais sério e mais complexo do que a vida sexual dos bagres. Em menos de dez dias quase 80 mil operários se rebelaram contra as condições de trabalho e simplesmente decidiram suspender as atividades nos cinco principais canteiros de obras do PAC. Ao longo da última semana, obras como a construção das usinas de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia, o complexo termoelétrico de Pecém, no Ceará, a refinaria Abreu e Lima e o complexo portuário de Suape, ambos em Pernambuco, ficaram paralisadas. Na quinta-feira 24, parte dos trabalhadores começou a retomar as atividades, mas o clima permanecia tenso nos canteiros de obras.
Foi exatamente às margens do mesmo rio Madeira, que abriga os bagres que tanto irritaram Lula, que o problema eclodiu na terça-feira 15. Enfurecidos por conta do que parecia ser apenas uma briga entre um operário e um motorista de uma das empreiteiras que estão construindo a usina de Jirau, os trabalhadores iniciaram uma revolta violenta. Pelo menos 300 operários atearam fogo nos alojamentos, escritórios e caixas eletrônicos do canteiro de obras da Camargo Corrêa. A situação só voltou à relativa normalidade depois que 500 homens da Força Nacional foram enviados ao local. Rapidamente a revolta espalhou-se por outras obras e culminou com a maciça paralisação da semana passada.
Em entrevista exclusiva à revista ISTOÉDinheiro, o presidente da construtora Camargo Corrêa, Antonio Miguel Marques, afirmou não acreditar que a revolta em Jirau tenha ocorrido por descontentamento com as condições de trabalho. Ele vê três hipóteses para o quebra-quebra e os incêndios: banditismo, briga sindical e insatisfação com o aumento da segurança no acampamento. “Foram atos de vândalos. Eu não concebo que uma briga entre um motorista de ônibus e um empregado embriagado possa motivar a queima de mais de 40 ônibus. Não se faz isso com palito de fósforo e isqueiro, é preciso ter combustível preparado para isso.” Marques acredita na hipótese de banditismo porque, no mesmo momento em que ocorreram os tumultos, houve dois assaltos aos postos bancários nos acampamentos nos dois lados do rio Madeira.
A revolta de Jirau assustou o governo que, distante das obras e exigindo prazos enxutos para a conclusão dos projetos, não estava atento à insatisfação crescente nos canteiros de obras. “Há dois anos a CUT avisava que poderia haver problemas, queríamos contrapartidas sociais para que essas obras fossem realizadas”, diz o presidente da Central Única dos Trabalhadores, Artur Henrique, que participou de uma reunião convocada às pressas pelo Planalto com o secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, na quarta-feira 23. Com ele estava o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), presidente da Força Sindical. Acuado pela situação, o governo concordou com os sindicalistas. “Em obras em que trabalhadores ficam confinados, se não houver respeito ao pagamento de horas extras, se houver truculência das chefias e dos seguranças, se não houver condições de higiene e alimentação dignas, a eclosão da violência é algo inevitável”, disse Gilberto Carvalho, que marcou um novo encontro com as centrais na terça-feira 29.
Ainda não está claro o que motivou de fato a revolta em Jirau. Para os sindicalistas, a razão está na terceirização constante da mão de obra e a falta de respeito às condições de trabalho. “As empresas não cumprem os mais elementares direitos trabalhistas”, afirma Adalberto Galvão, vice-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria da Construção Pesada. Já Marques, da Camargo Corrêa, sustenta que os motivos não poderiam ser esses. “Jirau é uma obra com nível atipicamente baixo de terceirização. É uma obra de grande responsabilidade para ser executada em prazo exíguo, então predominam os recursos próprios.” Cabe agora ao governo investigar e fiscalizar para que novos problemas como o das últimas semanas não atrasem ainda mais as obras do PAC.
26 de mar. de 2011
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