18 de mai. de 2009

Epidemias esquecidas

Com o mundo voltado para o surto da gripe A, que já matou 72 pessoas desde o fim de abril, doenças como malária, cólera e dengue, que fazem milhões de vítimas a cada ano, não recebem a atenção devida

Da Redação

 

Enquanto o mundo se espanta com a gripe suína, que já contaminou 8.480 pessoas em 39 países e matou 72 pessoas, outras epidemias e até endemias — que acontecem de forma contínua ou com uma periodicidade característica — mais fatais não recebem a atenção que deveriam. A Organização Mundial de Saúde (OMS) revela números preocupantes, especialmente referentes à África, que é refém de, pelo menos, três grandes vilãs: cólera, malária e poliomielite. Essas doenças endêmicas também são as principais responsáveis por assolar os países do sul da Ásia afetados por grandes catástrofes climáticas, como Mianmar. Na América do Sul e no Brasil, dengue e malária figuram como as maiores ameaças.

Segundo a OMS, 3,3 bilhões de pessoas — metade da população do planeta —, correm o risco de contrair malária. Por ano, aproximadamente 250 milhões são infectadas e, destas, cerca de um milhão não sobrevive. Na África, o cenário é ainda mais desolador: uma criança morre de malária a cada 30 segundos, sendo essa a responsável por 20% da mortalidade infantil. “Expandir as áreas livres de malária no continente africano requer ações decisivas dos governos, de organizações não governamentais (ONGs), do setor privado e da sociedade civil”, afirmou o diretor regional da OMS para a África, Luis Sambo, durante o Dia Mundial de Combate à Malária, em abril deste ano. Causada por parasitas, a doença transmitida por mosquitos é ainda mais difícil de ser contida em lugares sem saneamento básico.

Assim como a malária, a cólera atinge particularmente regiões pobres, sem condições básicas de saneamento. Transmitida por alimentos e água contaminados pela bactéria Vibrio cholerae, a cólera é uma infecção intestinal que pode matar por desidratação causada por diarreia e falência dos rins. De acordo com a OMS, atualmente a doença é considerada endêmica em diversos países, e a situação é ainda mais drástica pelo fato de o patogênio da cólera (organismo que a desencadeia) não poder ser extinguido do meio ambiente. Um dos lugares mais atingidos é o Zimbábue, onde os mais de 12 milhões de habitantes vivem sob a sombra da cólera. De agosto de 2008 até março deste ano, a doença já fez mais de quatro mil vítimas fatais no país, que registra cerca de 90 mil contaminados.

Um pouco mais acima do continente, na região centro-oeste africana, Níger, Nigéria e Chade sustentam uma endemia de meningite. Apesar de ser facilmente prevenida, a doença atingiu níveis alarmantes nesses países, com 56 mil infectados e quase dois mil mortos. Diante dos números, os governos da região e a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) mobilizaram a maior campanha de vacinação da história. Atualmente, 250 equipes de trabalho vacinam 1,5 milhão de homens e mulheres com idade entre 2 e 30 anos todos os dias. O trabalho conjunto das equipes médicas e dos governos procura impedir que se repita o surto de dez anos atrás, quando 25 mil pessoas perderam a vida por conta da doença.

Em março deste ano, a OMS lançou ainda um alerta para o vírus da pólio na Etiópia, no Quênia, em Uganda e no Sudão. A ação se concentrou principalmente na cidade de Porto Sudão, ao sul do país, que foi a origem do vírus que contaminou Arábia Saudita, Iêmen e Indonésia no surto de pólio entre 2004 e 2006.

 

BRASIL

Como os casos de cólera no Brasil são concentrados nos estados amazônicos, é a dengue que mais assola o país como um todo. Segundo a OMS, a taxa de letalidade da dengue por aqui é seis vezes maior do que a considerada aceitável. Desde o início do ano até 30 de abril, 87 pacientes com dengue hemorrágica ou com complicações da doença morreram, o que equivale a 6% do total de infectados. Pelos padrões da OMS, o máximo seria 1%. “É um índice muito alto, que revela ainda falhas importantes na assistência aos doentes”, disse o coordenador do Programa Nacional de Controle da Dengue, Giovanini Coelho à agência Estado no último sábado. Das 87 mortes confirmadas pela doença, a maioria foi registrada na Bahia e em Mato Grosso.

(Matéria publicada no Correio Braziliense de 18 de maio de 2009)

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