“Explicamos que tínhamos deliberado por sua execução e o matamos”
Carlos Eugênio da Paz, o homem da ALN que avalia fuzis “bons para execução”, concedeu uma entrevista à VEJA de julho de 1996. Reproduzo alguns trechos. Ele trata da morte como quem diz: “Está frio e hoje e sexta-feira”. Prestem especial atenção ao trecho em que ele trata do assassinato de um companheiro seu de militância, de quem, segundo disse, gostava… Imaginem o que não faria — e não fez — com inimigos…
(…)
VEJA - Além de assaltar bancos nos anos 60 e 70, as organizações terroristas de esquerda também assassinaram pessoas. Quantas pessoas o senhor matou?
CARLOS EUGÊNIO - Calculo que o total fique perto de dez. Não dá para ter certeza porque, muitas vezes, você atirava de metralhadora para sair de um cerco policial e não podia saber se havia acertado e, menos ainda, se tinha matado. Mas sempre que matei foi para sobreviver. Naquela época, eu acordava de manhã com a metralhadora na mão, enchia os bolsos de granada, pegava uma pistola e saía para rodar pela cidade num carro roubado. Uma vez, em São Paulo, fui perseguido por uma viatura da polícia até que consegui acertar o motorista com um tiro de fuzil. O carro bateu num poste, capotou. Acabei escapando, mas não sei se alguém morreu.
VEJA - Em 1971, Márcio Leite de Toledo, que era militante da ALN, foi morto pela própria organização. Por quê?
CARLOS EUGÊNIO - Tomamos essa decisão em duas reuniões. Em ambas, eu fui a favor da execução. No total, oito militantes foram ouvidos, e a decisão foi unânime. Por quê? Porque ele era um dirigente que sabia tudo sobre a organização, Havia estado em Cuba para treinar guerrilha, mas, ao voltar ao Brasil, dava sinais de fraqueza. Num assalto, em vez de proteger os militantes, como o combinado, fugiu correndo. Estava fraco, querendo deixar a luta. Concordamos que saísse da organização. Mas exigimos que deixasse o Brasil — poderíamos até mandá-lo ao exterior — por um período de pelo menos seis meses. Ele discordava. Queria sair da ALN e ficar no país. Ora, naquela circunstância, com a polícia cada vez mais peno, ele seria preso e levaria outros quinze militantes com ele. Marcamos um ponto com ele, fomos lá, explicamos que tínhamos deliberado por sua execução e o matamos.
VEJA - Quatro pessoas participaram desse assassinato. Duas ficaram de vigília e duas atiraram. O que você fez?
CARLOS EUGÊNIO - Eu atirei.
VEJA - O que acontece quando você pensa nessa morte hoje?
CARLOS EUGÊNIO - É difícil. Eu tinha até simpatia pelo Mauro, mas não vou fingir arrependimento. Tenho certeza de que, se não o matássemos, pelo menos quinze militantes acabariam morrendo, e minha culpa seria maior. A lógica em que vivíamos na época era a lógica da violência, da guerra, e não existe guerra limpa. Nós vivíamos uma situação que só poderia levar a isso. Se você aceita empregar métodos violentos, tem de aceitar a sujeira que vai produzir. É o que sempre acontece. Você começa atirando contra o inimigo, depois acerta o antigo companheiro e assim por diante.
(…)
VEJA - E quem fez [a luta armada]?
CARLOS EUGÊNIO - Fomos nós, garotos, gente com 18 anos na época, ou menos do que isso. Eu tinha 17 anos quando participei de minha primeira ação. Assaltamos um cinema no Rio de Janeiro. Demos treze tiros no guarda que tomava conta da bilheteria. Ele não morreu porque nenhum de nós sabia atirar. Ficou com bala no braço, na perna, no ombro, mas sobreviveu,
Encerro
É isso aí, leitor! Como vocês viram, Carlos Eugênio admite que todos, também os terroristas, estavam numa guerra suja. Vocês perceberam que ele tenta desmoralizar uma de suas vítimas, que era seu “companheiro”. Muito humanas, as organizações extremistas de esquerda explicavam para os “condenados” por que eles seriam executados. Moralmente, isso consegue ser pior do que a ação dos torturadores. Ao “explicar”, é como se tentassem obter a anuência do futuro cadáver.
Carlos Eugênio, insisto, é um “anistiado” pela Comissão de Anistia. As famílias de suas vítimas jamais receberam um tostão do estado. Se entrassem com um pedido junto à comissão, é muito provável que fosse indeferido.
Aliás, por que não nomeiam este senhor para a tal “Comissão da Verdade”? Como a gente nota, sinceridade não lhe falta. Ele diz, com todas as letras, que há “fuzis bons para execução”. Um dos grandes militantes da causa da “Comissão da Verdade” e da revisão da Lei da Anistia é Paulo Vannuchi, ex-ministro dos Direitos Humanos e hoje assessor especial de Lula — cuida da criação do tal instituto. Atenção com o parágrafo que encerra este post.
Vannuchi era da ALN — isto é, era um comandado de Carlos Eugênio. Digam-me: Vannuchi não estava mesmo no lugar certo, a pasta que cuida dos Direitos Humanos?
Por Reinaldo Azevedo
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