O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, negou
nesta terça-feira, 16, arquivar o inquérito que investiga supostas fake
news contra membros da Corte. Em despacho de 4 páginas, Alexandre reagiu
enfaticamente à decisão da procuradora-geral da República, Raquel
Dodge, que havia informado o arquivamento da investigação.
“Indefiro integralmente o pedido da Procuradoria Geral da República”, decretou o ministro.
“Na presente hipótese, não se configura constitucional e legalmente
lícito o pedido genérico de arquivamento da Procuradoria Geral da
República, sob o argumento da titularidade da ação penal pública impedir
qualquer investigação que não seja requisitada pelo Ministério Público,
conforme reiterado recentemente pela Segunda Turma do STF (Inquérito
4696, Rel. Min. Gilmar Mendes), ao analisar idêntico pedido da PGR, em
14 de agosto de 2018.”
Por ordem de Alexandre de Moraes, a Polícia Federal fez buscas contra
investigados no inquérito nesta terça-feira, 16. Foram alvo da ação de
hoje o general da reserva Paulo Chagas, o membro da Polícia Civil de
Goiás Omar Rocha Fagundes, além de Isabella Sanches de Sousa Trevisani,
Carlos Antonio dos Santos, Erminio Aparecido Nadini, Gustavo de Carvalho
e Silva e Sergio Barbosa de Barros.
Durante a tarde, Raquel Dodge afirmou que a investigação estava
arquivada. Na petição, Raquel Dodge ainda afirma que, como consequência
do arquivamento, “nenhum elemento de convicção ou prova de natureza
cautelar produzida será considerada pelo titular da ação penal ao formar
sua opinio delicti”.
Em sua decisão, Alexandre de Moraes afirmou que “inúmeras diligências
foram realizadas e perícias solicitadas à Polícia Federal”.
“Porém, completados 30 dias de instauração deste inquérito, houve
necessidade de prosseguimento das investigações, e, nos termos previstos
no art. 10 do Código de Processo Penal, solicitou-se sua prorrogação à
Presidência do Supremo Tribunal Federal, que deferiu por 90 dias, com
subsequente vista à Procuradoria Geral da República para, na condição de
custos legis, tomar ciência e requerer eventuais providências que
entender cabíveis, no prazo de 10 dias, preservando-se o sigilo
decretado”, relatou o ministro.
Segundo Alexandre de Moraes, o arquivamento de Raquel “não encontra
qualquer respaldo legal, além de ser intempestivo, e, se baseando em
premissas absolutamente equivocadas, pretender, inconstitucional e
ilegalmente, interpretar o regimento da Corte e anular decisões
judiciais do Supremo Tribunal Federal”.
“O sistema acusatório de 1988 concedeu ao Ministério Público a
privatividade da ação penal pública, porém não a estendeu às
investigações penais, mantendo a presidência dos inquéritos policiais
junto aos delegados de Polícia Judiciária e, excepcionalmente, no
próprio Supremo Tribunal Federal, por instauração e determinação de sua
Presidência, nos termos do 43 do Regimento Interno”, anotou o ministro.
“Inconfundível, portanto, a titularidade da ação penal com os
mecanismos investigatórios, como pretende a Digna Procuradora Geral da
República, pois o hibridismo de nosso sistema persecutório permanece no
ordenamento jurídico, garantindo a possibilidade da Polícia Judiciária –
com autorização judicial, quando presente a cláusula de reserva
jurisdicional – se utilizar de todos os meios de obtenção de provas
necessários para a comprovação de materialidade e autoria dos delitos,
inclusive a colaboração premiada, como decidiu recentemente o Plenário
do Supremo Tribunal Federal, que, novamente, afastou a confusão.”
Entenda o caso
Em março, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, mandou abrir um
inquérito contra “notícias fraudulentas (fake news), denunciações
caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus caluniandi,
diffamandi ou injuriandi, que atingem a honorabilidade e a segurança do
Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares, extrapolando a
liberdade de expressão”. Na ocasião, o ministro citou um artigo do
regimento interno do STF, segundo o qual, “ocorrendo infração à lei
penal na sede ou dependência do Tribunal, o Presidente instaurará
inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição”.
Ao autorizar a operação desta terça, Alexandre também mandou bloquear
contas dos investigados no Facebook, no WhatsApp, no Twitter e no
Instagram.
“Autorizo desde logo o acesso, pela autoridade policial, aos
documentos e dados armazenados em arquivos eletrônicos apreendidos nos
locais de busca, contidos em quaisquer dispositivos”, ordenou Alexandre.
“Após a realização das diligências, todos os envolvidos deverão prestar
depoimentos.”
Na segunda-feira, 15, no âmbito do inquérito, o ministro determinou à
revista “Crusoé” e ao site “O Antagonista” que retirassem do ar
imediatamente a reportagem intitulada “amigo do amigo de meu pai”, que
cita o presidente da Corte, Dias Toffoli. A revista repudiou a decisão e
denunciou o caso como censura. Alexandre impôs ainda uma multa diária
de R$ 100 mil em caso de desobediência.
“Determino que o site O Antagonista e a revista Crusoé retirem,
imediatamente, dos respectivos ambientes virtuais a matéria intitulada
‘O amigo do amigo de meu pai’ e todas as postagens subsequentes que
tratem sobre o assunto, sob pena de multa diária de R$ 100 mil, cujo
prazo será contado a partir da intimação dos responsáveis. A Polícia
Federal deverá intimar os responsáveis pelo site O Antagonista e pela
Revista Crusoé para que prestem depoimentos no prazo de 72 horas”,
ordenou.
O ministro não fez nenhuma declaração sobre sua decisão, mas a
interlocutores próximos ressaltou que não impôs censura às publicações.
Na avaliação de Alexandre, “liberdade de imprensa impede a censura
prévia, mas não responsabilização posterior”.
O ministro ressaltou que “a notícia se baseou na PGR, que a
desmentiu, mesmo assim insistiram na fake news”. “Isso está claro na
decisão.”
A reportagem está tentando localizar as defesas de todos os citados. O espaço está aberto para manifestação.